também o Público computadores nos dá mais alguns detalhes.
http://jornal.publico.pt/2004/06/07/sotexto/Computadores/TI01.html
Projecto-piloto de voto electrónico nas eleições europeias
Portugal Volta a Ensaiar o Voto por Computador
Segunda-feira, 07 de Junho de 2004
Fátima Caçador / Casa dos Bits
Os eleitores de nove freguesias do Continente vão poder experimentar, no próximo dia 13 de Junho uma forma diferente de votar, através de um sistema de voto electrónico. O projecto foi aprovado pela Comissão Nacional de Eleições e está a ser desenvolvido pela Unidade de Missão Inovação e Conhecimento (UMIC) em conjunto com o Secretariado Técnico dos Assuntos para o Processo Eleitoral (STAPE), envolvendo três parceiros tecnológicos, dois dos quais em consórcio.
A experiência não tem ainda valor legal, pelo que os eleitores destas freguesias vão ser convidados a fazer um segundo voto logo a seguir ao processo normal, que já realizaram junto da mesa de voto em cujo caderno eleitoral estão inscritos. A acompanhar o processo vão estar folhetos informativos, para além de assistentes, que poderão auxiliar os mais tímidos em relação às novas tecnologias.
Sem necessitarem de boletim de voto nem de caneta, os votantes só precisam de tocar no ecrã das máquinas disponibilizadas para escolher o partido ou coligação da sua preferência – seguindo-se depois um passo de confirmação, após o qual está terminado o processo de voto. Além disso, poderão responder a duas questões destinadas a colher as suas impressões acerca deste modelo de votação, que serão depois tratadas estatisticamente no âmbito da avaliação do projecto-piloto.
Para utilizadores habituados a sistemas de Multibanco e quiosques electrónicos, não é esperada estranheza de maior no uso das máquinas de voto nem dúvidas quanto ao processo electrónico. A questão estará na disponibilidade dos cidadãos para experimentarem o novo sistema depois de já terem exercido o seu direito de voto. Diogo Vasconcelos, gestor da UMIC, sublinha que esta iniciativa se destina sobretudo a sensibilizar os eleitores e a aferir a receptividade política para este sistema de voto – que já é usado em muitos países do mundo em substituição dos tradicionais métodos de sufrágio.
“Numa matéria tão sensível e tão importante para a democracia, é preciso darmos passos seguros para não introduzirmos elementos de dúvida”, explicou Diogo Vasconcelos a Computadores. Por isso mesmo, a UMIC alinhou o projecto com o STAPE de forma a garantir a segurança e a confidencialidade do processo, trabalhando com as empresas fornecedoras da solução tecnológica de forma a assegurar a facilidade de utilização do sistema.
Uma outra vertente de informação está também a ser desenvolvida pela unidade ministerial, tendo sido enviada informação aos eleitores das freguesias seleccionadas, para além da criação de folhetos explicativos sobre o processo, que se destinam a afastar eventuais dúvidas que surjam.
O mesmo cuidado foi aplicado na escolha das freguesias onde se realizará o teste, procurando-se a maior diversidade em termos geográficos, de enquadramento sócio-económico, de dimensão e de multipartidarismo. Assim, as salas de voto electrónicas serão montadas nas secções de voto das freguesias de Santa Maria de Belém (Lisboa), Paranhos (Porto), S. Sebastião (Setúbal), Mangualde (Viseu), Sé (Portalegre), Mirandela (Bragança), S. Bernardo (Aveiro), Salvador (Beja) e Salir (Faro), abrangendo cerca de 100 mil eleitores.
Da mesma forma, foram envolvidas quatro universidades independentes para darem apoio na área da auditoria ao processo e dos seus resultados. As universidades que participam são a do Minho, a do Porto, a Clássica de Lisboa e a Técnica de Lisboa.
Este é já o terceira ensaio de sistemas de voto electrónico em eleições portuguesas mas é o que assume maior dimensão e amplitude geográfica. As duas primeiras experiências foram realizadas em 1997 e em 2001 em eleições autárquicas, e envolveram, no primeiro caso, uma freguesia de Lisboa (S. Sebastião da Pedreira), enquanto, em 2001, se realizou o teste em duas juntas de freguesia: Campelo em Baião, no Norte, e Sobral de Monte Agraço, no Centro.
Das duas vezes, apesar da diferenças entre as localizações escolhidas, “a receptividade foi entusiástica”, afirmou José Miguéis, subdirector-geral do STAPE. A tecnologia utilizada foi fornecida pela Omron, sofrendo evoluções entre as duas eleições. Em cada uma das freguesias, foi colocada apenas uma máquina, onde os eleitores tiveram oportunidade de exercer um voto não vinculativo. Segundo o subdirector-geral do STAPE, os eleitores reagiram então muito bem e não colocaram qualquer questão relativa à segurança ou à confidencialidade do voto.
No projecto-piloto que se realizará neste ano, vão ser utilizadas três soluções tecnológicas diferentes, embora com interfaces semelhantes de contacto com o eleitor. As máquinas são fornecidas pelas três empresas seleccionadas pela UMIC para o projecto: a portuguesa Multicert, em consórcio com a PT Inovação, a Indra CPC e a Unisys, também em parceria com a PT Corporate e com o apoio da Elections Systems and Software (ES&S). O investimento do Governo na experiência é inferior a 500 mil euros e os equipamentos não são comprados pelo Estado.
Cada uma das empresas irá estar em três das freguesias seleccionadas, sendo a distribuição organizada por zonas geográficas, ficando a Multicert com o Norte, a Indra com o Centro e a Unisys com o Sul. Ao todo, serão utilizadas quase 70 máquinas de voto, 30 disponibilizadas pela Indra, 22 pela Unisys e 17 pela Multicert – todas com ecrã táctil e suportando mecanismos de autenticação que credenciam o eleitor e não permitem a repetição do voto. Está também assegurada a possibilidade de voto aos invisuais nos equipamentos da Indra e da Unisys.
A Indra tem uma experiência longa neste tipo de soluções e o seu Point&Vote já foi utilizado em diversos países. Maria Gabriela Recla, responsável pelos processos eleitorais na empresa, explicou a Computadores que a Venezuela é um caso de sucesso, tendo a solução da Indra já sido utilizada em nove eleições entre 1998 e 2000, com a instalação de 7300 urnas, que receberam os votos de mais de 11 milhões de eleitores.
Em 2003, o mesmo equipamento foi usado em eleições em Inglaterra, no Epping Forest District Council, e na Argentina, na cidade de Ushaia. No próximo domingo, a Indra participará também com a mesma solução eleitoral na cidade de Vandoeuve-les-Nancy, em França, aqui com validade legal, mas também em testes-piloto que decorrem nas cidades de Reims, Toulouse e Chalon.
Maria Gabriela Recla destaca a diversidade de experiências na Europa, motivada muitas vezes por diferenças legais – mas afirma que já são poucos os países da União Europeia que não dispõem de uma lei eleitoral que permita aos eleitores exercerem o seu voto através de soluções baseadas nas mais recentes tecnologias disponíveis no mercado.
A Unisys conta igualmente com uma vasta experiência internacional, em colaboração com a ES&S, que desenvolveu a solução. Um dos projectos de destaque da empresa é o do processo eleitoral no Brasil, onde forneceu mais de 130.000 “urnas eleitorais electrónicas”, que permitiram que os votos de 90 milhões de cidadãos fossem contados e classificados no prazo de apenas 12 horas – com reduções significativas no que respeita a fraudes e imprecisões típicas do anterior sistema manual, conforme justifica Manuel Correia Neves, director de projecto na Unisys Portugal.
A empresa portuguesa Multicert – especializada em soluções de certificação electrónica – tem também no seu currículo algumas experiências bem sucedidas, entre as quais a recente eleição para o Sindicato de Bancários de Sul e Ilhas (SBSI), que permitiu que 5 por cento dos bancários exercessem o seu direito de voto através da Internet, autenticando o seu acesso com um número de identificação pessoal, conjugado com a data de nascimento e o número de sócio do sindicato.
José Pina Miranda explicou a Computadores que a Multicert detém conhecimento de votação através da Internet, completando-o com o “know how” da PT Inovação em ambientes de quiosque informático e sua segurança, o que levou ao consórcio entre estas duas empresas portuguesas para este projecto.
Todas as soluções permitem a evolução futura para modelos de votação electrónica não presencial e multiplataforma, que admitem a mobilidade do eleitor.
As expectativas de adesão são elevadas, mas ninguém quer arriscar sequer a indicação de uma percentagem de segundo voto nas nove freguesias-piloto, já que as próprias sondagens não indicam números muito risonhos em termos de presença dos eleitores no processo eleitoral. Num fim-de-semana que, para muitos, poderá ser de ponte, a possibilidade de usar plataformas como a Internet ou as redes móveis para votar poderia reduzir a abstenção – facilitando, ao mesmo tempo, que cidadãos que se encontrem longe das suas freguesias eleitorais pudessem exercer o direito de voto.
Mas essa poderá ser uma evolução futura, havendo que aguardar pela experiência do próximo dia 13 de Junho, que se espera seja bem sucedida. Primeiro que tudo, é preciso que a Lei Eleitoral seja alterada, contemplando a possibilidade do voto electrónico, para que este modelo seja alargado a todas as freguesias com validade legal.